terça-feira, 31 de dezembro de 2013

PESCARIA DE FIM DE TARDE E OS VENDILHÕES DA FÉ

Por Julio Zamparetti

Depois de mais uma pescaria daquelas de fim de tarde, em que a gente vai mais interessado na atividade e relaxamento do que no próprio peixe, voltando pra casa, pensei nas igrejas evangélicas que um dia houveram naquele caminho (e lembro-me de pelo menos quatro). Observei que hoje não há mais nenhuma sequer. Fiquei pensando: onde estaria essa gente? Para onde foram seus pastores? Quantos encontraram outra igreja? Quantos voltaram para a igreja Católica? Quantos, desiludidos, abandonaram a fé? Quantos tiveram sua fé corrompida e depois foram abandonados por mercenários que se intitulavam missionários?

Como eu que buscava naquela pescaria a minha própria satisfação, alguns, não poucos, buscaram naquele vilarejo a satisfação de seu brio religioso. Lançaram suas redes tecidas com linhas de um evangelho estranho, baseado no que chamam de dom de revelação, visão do Espírito, profecias e outros recursos que realmente beiram a loucura (eu disse ‘beiram’ para ser gentil). Suas interpretações bíblicas são outro artifício maligno, sem contexto histórico, textual, nem mesmo gramatical, visam unicamente apregoar o velho anti-catolicismo, convencendo os católicos de que estão todos perdidos e que devem se converter à nova igreja. Dessa forma, arrebatam para si as ovelhas de quem tosquiarão até a última lã. Depois disso, lã tosquiada, fé corrompida, família dividida, escândalo deflagrado, máscara caída, dízimos recolhidos, é fim da tarde, recolher as redes, buscar outros mares. Eu disse mares? Imagine! Pescadores de fim de tarde não buscam mares, buscam açudes, quanto menor melhor, onde o peixe já foi bem tratado pelos criadores e não têm para onde correr.

O Evangelho não é uma teia de argumentos para convencer alguém de sua razão, muito menos para satisfazer o desejo de seres que querem ser seguidos por alguém; também não é uma forma de dominação, nem uma ação circunstancial e momentânea. Ele é antes, bem antes, o amor que nos compromete na caminhada constante e eterna pela paz entre os divergentes, unidade na diversidade, justiça social, preservação ambiental e co-responsabilidade humana.


Já disse Jesus: Se alguém pretende construir uma torre, veja antes se tem recursos para concluí-la. Infelizmente, esses falsos pastores não estão preocupados com o que será das ovelhas que nem são suas. Só querem saber de seu prazer, sua glória, sua demonstração de poder e assim serem vistos como “servos do Altíssimo”. Se depois não der certo, problema de quem fica. Como eu sei que novas igrejas, ou diria, torres malacabadas(sic) continuarão à surgir, resta-me o recurso de dizer a você que não seja mais uma vítima desses mercenários. O mundo precisa de conversões, sim! Conversões que manifestem mudança de atitude, não de religião.

sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

POR QUE AINDA VAMOS À IGREJA?

Por Julio Zamparetti 

Um Deus de promessas e serviço é o que todos procuramos. É isso que esperamos sentados e de mãos estendidas, pedindo que algo se nos dê, que alguma coisa aconteça. Mas será que realmente cremos em Deus? Não estaríamos depositando a fé, na verdade, numa espécie de Super-man? Afinal, para que nos serve esse Deus?

Volto a me perguntar: por que ainda vamos à igreja? O que procuramos nela? A resposta que ouço não é a mesma que vejo. Porque os nossos lábios dizem que vamos à igreja “adorar ao Senhor”, ao passo que nossas atitudes mostram  que vamos massagear nosso próprio ego, pois saímos de lá tão presunçosos e cheios de si, que tornamo-nos incapazes de nos identificarmos com os pecadores, pobres e miseráveis com quem Jesus se identificou, andou, serviu, conversou, sorriu, festejou, comeu e bebeu. Nossos lábios dizem que vamos “encontrar a Deus”, mas nossas atitudes mostram que não podemos vê-lo, porque só vemos maldade e malícia em tudo o que nos rodeia. Nossos lábios dizem que queremos ser cidadãos dos céus, todavia nossas atitudes mostram que, cada vez mais, estamos acorrentadas às futilidades e riquezas terrenas, de maneira que fizemos delas a própria razão de nossa fé. Nossos lábios dizem que queremos ser felizes, mas nossas atitudes mostram somente a infelicidade de apenas anestesiarmos nossas almas, já não sendo mais capazes de alcançar a felicidade de chorar com os que choram. Nossos lábios dizem que almejamos alcançar a misericórdia divina; no entanto, nossas atitudes mostram a impossibilidade disso, pois nos afastamos dela cada vez que a negamos a quem quer que dela necessite. E a despeito de tudo isso, ainda esperamos que Deus faça alguma coisa, que nossas orações mudem tudo e todos, mas nós mesmos não mudamos.

Deus não se fez um super-herói, se fez homem. Não fez por nós as coisas que devemos fazer, mas serviu sim de exemplo para que nós o seguíssemos, tomando nossa cruz e fazendo o que está à nossa mão para fazermos. Deus também não nos deu as respostas prontas. Como fez no passado, ainda hoje faz, nos leva a olharmos para o nosso interior e buscarmos as respostas no íntimo de nosso consciente, e depois disso, assumirmos as responsabilidades que venhamos a contrair através de nossas respostas e escolhas, principalmente quando, por conta delas, necessitarmos pedir perdão.

A igreja não existe para nos conduzir a um caminho de poder, mas sim para nos fazer entender nossas fraquezas e seguirmos a trilha da humildade e compaixão; não existe para nos fazer deuses, mas sim para nos tornar mais humanos, pois é justamente na nossa humanidade que Deus é revelado, e na nossa fraqueza sua força é manifestada. Afinal, assim como por uma humilde mulher nasceu o próprio Deus, assim também, em nossa pobre humanidade o Cristo é gerado. Ao que o anjo diz: “não temas receber Maria”, direi, então: não temas receber a humanidade do ser, não temas ser humano. A igreja não existe para aliviar a nossa consciência atulhada pelo nosso descaso com as causas ambientais e sociais, mas sim para nos comprometer com a luta por um mundo melhor, sem fome e mais justo. Se algo diferente disso existe - e lamentavelmente existe - com certeza não é igreja.

Estou convencido de que o templo é último lugar onde podemos encontrar a Cristo. Nas Escrituras Cristo é relatado apenas quatro vezes dentro do templo, das quais duas vezes ele ainda era um bebê. Entretanto, Cristo é relatado constantemente nas ruas, montanhas, praias, vilarejos, entre pecadores, leprosos, prostitutas, gente excluída de sua época e, como se isso não bastasse, Ele ainda disse que o encontraríamos nos presos e miseráveis desse mundo. Portanto, só encontrará Cristo na igreja quem for capaz de encontrá-lo em qualquer outro lugar. Por isso penso que a única razão pela qual devo ir à igreja é para aprender a viver no mundo. Se a igreja não ensina isso, nem para isso serve.