segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

PRECISAMOS DE LEIS?

Baseado em Mt.5,21-37
Por Julio Zamparetti

É muito difícil para nós seres humanos abrirmos mão do controle da situação; é difícil confiarmos nos outros; admitamos: é difícil confiar em Deus.

Para tudo impomos normas, regras e condições por uma única razão: queremos a garantia de que tudo sairá do jeito que desejamos.

As igrejas não confiam que seus fiéis saberão escolher entre o bem e o mal. Por isso lançam cartilhas e dogmas determinando o que é bom ou mal, que lugares freqüentar, o que se deve ou não beber, assistir, ouvir, vestir, etc.

Também os pais não confiam que seus filhos são capazes de tomarem suas decisões, pois não os prepararam para essa hora. Agora, querem decidir por eles a decisão que só a eles pertence tomar.

Na verdade a carência que temos de leis que estabeleçam nossa conduta diária é congruente a deficiência que temos em expressar o caráter de Cristo. Isso porque todo aquele que expressa em sua vida a vida de Cristo, ainda que não conheça uma só lei, cumprirá, essencialmente, toda ela, pois, por amor a Deus, jamais fará aos outros aquilo que ele não quer que lhe seja feito, ao mesmo tempo em que fará ao próximo aquilo que deseja que lhe façam os outros.

Portanto, fazer o bem a quem quer que seja não deveria ser uma imposição arbitrária, exigida por uma terceira pessoa. O ideal é que a bondade seja um fruto gerado no âmago da primeira pessoa (EU), isto é, só é bondade o bem gerado no íntimo do coração.

Não digo com isso que toda lei seja má. De forma alguma! Elas podem ser boas e necessárias, na mesma medida em que somos maus e débeis. A boa lei nos serve exatamente para regular e remediar nossas maldades e debilidades. Seria, ela, absolutamente desnecessária se fôssemos realmente bons, pois então faríamos o mesmo bem que a lei pretende, porém faríamos não por obrigação, mas sim por simples expressão do ser.

É nesse sentido que Cristo nos propõe algo muito superior que a lei. Já dizia o sábio que prevenir é melhor que remediar. Segundo Jesus, os antigos falavam: “Não matarás”. Ele, no entanto, disse: “se te irares contra teu irmão, serás levado a juízo”. Graças a Deus não era essa uma nova lei, mas uma nova perspectiva de condução moral. Antes de proibir o assassínio, que é o efeito da ira, Jesus propôs tratar a ira, que é a causa do assassínio; Antes de reprimir o adultério, que é o efeito da cobiça, propõe tratar as nossas cobiças que são a causa do adultério; Antes de coibir a exploração, devemos tratar as ambições.

É claro que não somos perfeitos (ainda), por isso necessitamos de regras, normas, costumes, leis e alguns dogmas. Mas é indispensável que essas leis, ou religiosidade, sejam regidas pelo amor e produzam no coração daqueles que a seguem, algo maior e muito mais precioso que a própria lei, ou religiosidade em si.

O valor de uma ostra está na pérola que ela produz. O valor de uma religiosidade está no tesouro precioso, o Reino de Deus, que é gerado no interior daquele que crê. Fora isso, a ostra não tem valor... nem as leis e a religiosidade.

5 comentários:

  1. As regras, lei, não são necessárias se partimos do pressuposto que o homem é bom por natureza. Se por outro lado acharmos que o homem é mal por natureza, não nos resta mais esperança, pois, as próprias leis refletiriam essa essência má. Mas, podemos pensar o ser humano com um ser dual, dualista. Então ele pode ser bom ou mal.

    Se levarmos em conta a opção dualista, fica uma questão: como identificarmos o que é bom e o que é mal sem entrarmos no relativismo? O foi bom antigamente pode se tornar mal agora. O que é bom hoje pode ser o mal de manhã.

    Precisamos de um referencial, objetivo, imutável, o que se aproxima desse referencia se aproxima do bem, o que se afasta desse referencial se afasta do bem. Essa referencia para mim é a personalidade de Jesus Cristo.
    O resto se resume a regras baseadas no controle, onde pessoas jogam nas costas de outros fardos que elas mesmas não conseguem suportar.

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  2. Tudo isso partindo da noção platônica de que há "bem" ideal.

    Na verdade o nós mesmos inventamos a noção de bem/mal e só existe relativamente a nós.

    Um animal faminto que nos coma não estará nos fazendo o mal, apenas saciando sua fome, indiferente como é a natureza.

    Fazer aos outros aquilo que desejamos que nos façam, muito bem, e no caso de um masoquista que gosta de ser maltratado, deveria então maltratar os outros e isso seria bom... Aqui pode-se dizer que na verdade ele está doente ou pelo menos enganado quanto ao que é bom, argumento que se funda na pressuposta existência de um bem absoluto que se pode ou não conhecer.

    O fato é que o universo não conhece muito menos obedece a nossos conceitos que só são úteis a nós. Um meteoro que extermine a vida nesse planetinha não seria mal, seria apenas uma casualidade em meio a bilhões de bilhões de outras que estão se passando agora nessa inapreensível realidade que partilhamos...

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  3. Se viajarmos por outras culturas ou mesmo para outras épocas dentro de uma mesma cultura vamos nos deparar com uma infinidade de definições de bem e mal... Difícil será alguém definir o que é "Bem" essencialmente. Afinal isso é apenas uma qualidade que atríbuímos a determinadas ações que sempre estarão subordinadas ao contexto em que ocorrem e aos interesses/crenças de quem profere o julgamento moral. Era bom que garotos tivessem um relacionamento afetivo-sexual com homens mais velhos na grécia antiga antes de atingirem a puberdade, e que mulheres não trabalhassem ou estudassem até algumas décadas atrás em nosso país e por aí vai...

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  4. Julio Cezar, penso que poderíamos encaixar o masoquista no sentido de dar ao outro o direito de ser tratado como queira. Se um masoqista quer o direito de ser mal-tratado, porque isso lhe parece bom, também deve respeitar quem, pelo mesmo motivo, deseja ser bem tratado. Entretanto, não tenho a pretensão de solucionar o insolucionável. Bem ou mal, certo ou errado são conceitos que sempre dependerão do ângulo sob o qual vemos as circunstâncias. E nessas horas, a história nos ensina que as leis podem ser tão boas quanto ruins.

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  5. Julio Cesar ...
    Como eu disse "precisamos de um referencial". Sem um referencial seriamos barcos sem leme, sem rumo, onde os ventos da casualidade nos levaria a lugar nenhum da subjetividade, simplesmente ao acaso, em tempestades sem direção. Eu prefiro ter um referencial, Jesus Cristo, sendo uma decisão pessoal, a minha.

    .....

    Fica algumas questões pra você:
    (utilizando seu exemplo do universo e do animal)
    Você, parte desse universo, possui uma consciência que te diferencia do animal, a mesma consciência ou auto-consciências por qual você ganha subjetividade, noção existencial, causal etc... que de alguma forma te da uma noção do que é bom ou mal pra você. Se abrires mãos desse atributo, em que serias diferente dos animais?

    Mas se você reparar, o próprio animal tem uma consciência de bem e mal. Maltrate um cavalo e depois tente monta-lo. Acaricie, dê carinho, e tente monta-lo. Você vê diferença na reação do animal baseado na sua atitude para com ele? Não seria essa reação uma reação de quem sabe o que não é bom para si?

    >>>

    O universo não conhece muito menos obedece a nossos conceitos ou NÓS ainda não conhecemos nem obedece os conceitos do universo?

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